10 de abr. de 2009

A história da terceira geração do romantismo

As idéias liberais, abolicionistas e republicanas formam a base do pensamento brasileiro no período de 1870 a 1890. Influenciados por Auguste Comte, Charles Darwin e outros autores europeus, escritores como Tobias Barreto, Silvio Romero e Capistrano de Abreu empenham-se na luta contra a monarquia. Ao lado deles, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa e Castro Alves também se destacam na divulgação do novo ideário.
O engajamento em questões da realidade social e a oposição ao governo central tornam-se incompatíveis com o subjetivismo e o patriotismo, até então dominantes. Uma nova polêmica envolvendo José de Alencar é indicativa dos rumos que o movimento romântico toma nesse período. Ocorrida em 1871, a discussão foi iniciada pelo jovem romancista cearense Franklin Távora, que acusava Alencar de excesso de idealismo e pouco conhecimento empírico da realidade que retratava. A polêmica repercutiria sobre textos teóricos do próprio Alencar e também de Machado de Assis.
Na poesia, Castro Alves é o nome de maior destaque da terceira geração romântica. Autor de Espumas Flutuantes (1870) e do poema Navio Negreiro, ele celebrizou-se pela força lírica dos poemas em favor da libertação dos escravos. Também é relevante nesse período a figura de Sousândrade (1833-1902). Autor de uma poesia com momentos ricos em experimentalismo, como se pode notar pela leitura de O Guesa (1868), ele também teve atuação importante como cronista político.
As idéias liberais, abolicionistas e republicanas formam a base do pensamento da inteligência brasileira a partir da década de 1870, que concentra a produção da chamada Terceira Geração do Romantismo e marca o início da transição para o Realismo. Influenciados pela filosofia positivista e pelo evolucionismo professado por Auguste Comte, Charles Darwin e outros pensadores europeus, escritores importantes como Tobias Barreto, Silvio Romero e Capistrano de Abreu empenham-se na luta contra a monarquia. Ao lado deles, intelectuais de vasta formação humanística, como Joaquim Nabuco e Rui Barbosa, e poetas de grande expressão, como Castro Alves, assumem papel de destaque na divulgação do novo ideário.
Mesmo antes deles, já na década de 1860, é possível identificar a fermentação de idéias em favor da abolição e da República, com o aparecimento dos primeiros panfletos e jornais que defendiam o fim da escravidão e o estabelecimento de um regime republicano, o que resulta na fundação do Partido Republicano, em 1870. Nessa mesma década, quase duzentos mil imigrantes chegam ao Brasil para trabalhar nas lavouras de café do Sudeste, num processo que anuncia a substituição do trabalho escravo pela mão-de-obra livre.
No prefácio aos Vários Escritos, de Tobias Barreto, Silvio Romero sintetiza a efervescência do período: "O decênio que vai de 1868 a 1878 é o mais notável de quantos no século XIX constituíram nossa vida espiritual. (...) De repente, por um movimento subterrâneo que vinha de longe, a instabilidade de todas as coisas se mostrou e o sofisma do império apareceu em toda a sua nudez. A guerra do Paraguai estava ainda a mostrar a todas as vistas os imensos defeitos de nossa organização militar e o acanhado de nossos progressos sociais, desvendando repugnantemente a chaga da escravidão".
Aos poucos, o engajamento em questões da realidade externa e a oposição ao governo nacional, implícitos nessa mudança de visão aludida por Romero, vão se tornando incompatíveis com o subjetivismo e o patriotismo, ambos característicos das gerações românticas anteriores. Indicativa dos rumos que toma o movimento nesse período é outra polêmica envolvendo José de Alencar. Ocorrida em 1871, quinze anos depois da celeuma em torno do poema Confederação dos Tamoios, a discussão foi iniciada pelo jovem romancista pernambucano Franklin Távora.
Amigo de Silvio Romero e futuro autor do romance regionalista O Cabeleira (1876), Távora escreveu oito cartas com críticas severas ao romance O Gaúcho, de Alencar. As missivas foram publicadas no periódico quinzenal Questões do Dia, mantido pelo escritor português José Feliciano de Castilho, antigo desafeto político de Alencar. À resposta do célebre romancista, seguiram-se mais doze cartas de Távora, desta vez tomando Iracema como alvo. As acusações centrais eram o excesso de idealização dos personagens e a falta de conhecimento empírico a respeito do lugar retratado, indicativas da aspiração por uma representação mais realista da realidade brasileira.
Segundo o crítico Antonio Candido, a polêmica teve importância por dois motivos. Primeiro, porque as observações de Távora seriam o primeiro sinal, no Brasil, de apelo ao sentido documentário das obras que abordam a realidade presente. Segundo, porque o fato teria motivado Alencar a escrever, no prefácio do romance Sonhos D’Ouro (1872), uma importante reflexão sobre sua obra. Nesse texto, o romancista argumenta que o retrato das condições locais não é a única via para uma literatura nacional e reconhece a investigação social, psicológica e dos costumes contemporâneos como tarefa primordial do romancista.
Essa tomada de consciência teria repercussão imediata sobre o jovem Machado de Assis. Em 1873, no periódico Novo Mundo, ele publicaria Instinto de Nacionalidade, ensaio em que desenvolve o mesmo tema de Alencar e supera suas próprias idéias acerca da constituição de uma literatura nacional, expressas em artigos anteriores. O texto mostra com clareza uma perspectiva nova: "O que se deve exigir do escritor, antes de tudo, é certo sentimento íntimo, que o torne homem de seu tempo e de seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço", escreve Machado. Era o anúncio da transição realizada pelo escritor, que nos romances da década de 1870 põe à prova os preceitos do Romantismo, ao mesmo tempo em que expõe as limitações de uma representação da realidade calcada no elemento típico e no retrato pitoresco. Com isso, Machado preparava o caminho para a publicação de sua primeira obra-prima, Memórias Póstumas de Brás Cubas, de 1880, que marca a superação do Romantismo na prosa de ficção.

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